segunda-feira, novembro 27, 2006

Carry Trades (II)


Na prática a teoria é outra!

Odeio a frase acima! Reflete a imbecilidade daqueles que desprezam o saber por não serem capazes de manipular conceitos e modelos teóricos, nem de entender o poder das abstrações e muito menos conseguem interpretar adequadamente a construção teórica na realidade. Feito este sutil comentário, sou agora obrigado a concordar que um grande número de acadêmicos demoram muuuito tempo para trocar de marcha. Todos os anos ainda surgem dezenas de “sérias” pesquisas cujo objetivo é testar se a Hipótese da Eficiência dos Mercados é válida para determinado mercado. Após usar robustos e sofisticados testes estatísticos chegam sempre à “surpreendente” conclusão: tal mercado não é eficiente! O pior de tudo que se tenta concluir a partir disso que haveria uma preponderante manipulação daquele mercado (e não estou negando que haja tais manipulações). Bom, voltemos ao tema: Carry Trades.

A existência dos carry trades é uma verdadeira aberração diante da Hipótese da Eficiência dos Mercados - HEM. A HEM aplicada a condição de equilíbrio chamada de Paridade Descoberta das Taxas de Juros, garantiria que o diferencial entre as taxas de juros de dois países refletissem a expectativa de desvalorização das moeda de alta taxa de juros em relação àquela de menor taxa de juros. Ora, ao acontecer tal desvalorização, o investidor que houvera tomado empréstimo na moeda de baixo juros (valorizada) e que reemprestou na moeda de alta taxa de juros (desvalorizada) viu sua rentabilidade no diferencial de juros sumir diante da mudança da taxa de câmbio. Em suma, a teoria Paridade Descoberta das Taxas de Juros –UIP (Uncovered Interest Rate Parity ) tem como corolário que os carry trades não têm como ser lucrativos.

Na prática a teoria é outra. Digo, a observação empírica tem demonstrado que o modelo UIP é bastante inadequado, já que os carry trades têm se mostrado lucrativos. Tais operações vêm sendo muitas vezes apontadas como sendo responsáveis por várias oscilações importantes das taxas de câmbio, o que em um mercado de giro diário na ordem de 2 trilhões de dólares implica em grandes volumes sendo transacionados por conta dos carry trades.

O fenômeno da inesperada lucratividade dos carry trades está largamente documentado e nada tem de esporádico, o mesmo é chamado pelos economistas de forward premium puzzle, sendo caracterizado uma anomalia de mercado (eu digo: anormal é o economista que acha que seu modelo teórico não deve satisfação à realidade).

Forward Premium Puzzle
O Forward Premium Puzzle é a constatação de que as taxas de câmbio se comportam de forma oposta ao esperado, ou seja, ao invés de a moeda de menor taxa de juros se valorizar em relação a moeda de maior taxa de juros, ocorre o oposto. Conseqüentemente aquele que faz esse tipo de operação, além de ganhar no diferencial de juros, acaba também lucrando com a taxa de câmbio!
Em um estudo realizado por Craig Burnside, Martin Eichenbaum, Isaac Kleshchelski e Sergio Rebelo, The Returns to Currency Speculation, constatou-se que, no período entre 1977 a 2005, um portfolio unicamente baseado em carry trades obteve retornos iguais ao do SP500, porém com volatilidade consideravelmente menor (conseqüentemente com maiores retornos, quando ajustados ao risco).

O que ocasionaria tal efeito?
Ora, é um efeito de auto-reforço cujo crescimento suplanta rapidamente o mecanismo de ajuste do UIP, ou seja, ao tomar emprestado a moeda de menor juros e ofertá-la no mercado gera-se excesso de oferta, ao mesmo tempo que a compra da moeda de maior juros gera excesso de demanda. Esse efeito se intensifica e acelera durante meses a fio, pressionando cada vez mais para baixo o preço da moeda de juros mais baixos (dado em unidades da outra moeda). O que atrai mais e mais capital para o trade.

E como a bola de neve se desfaz?
Bom essa pode ser uma história triste para muito gestor .... a brincadeira do carry trade guarda grande semelhança com a “dança das cadeiras”, quando a música parar ... salve-se quem puder!





USDJPY Semanal. Clique na figura para ampliá-la.

3 comentários:

MasterChief disse...

Damiani
Excelente artigo!



Master Chief
http://statisticaltrading.blogspot.com/

Anônimo disse...

Realmente.
Muito bom!

Victor Carvalho Pinto disse...

Gostei muito do seu artigo. Pratico carry trade há 4 meses, em duas corretoras de forex, ganhando tanto nos juros quanto no câmbio.

Aliás, você deixou de mencionar essa hipótese de carry trade no artigo anterior.

Um amigo meu, economista, me emprestou um livro do Krugmann, sobre economia internacional, para que eu entenda que isso é impossível.

Seu artigo é a primeira explicação teórica que encontro sobre o assunto.

Acho surpreendente o quanto essa estratégia é pouco conhecida no Brasil.